Os melhores livros de 2020

Mateus Baldi
9 min readDec 28, 2020

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Li 112 livros em 2020. Eis os melhores — e a lista completa.

Foram 112 livros lidos em 2020 (a lista está no final do post), portanto é chegada a hora de destacar: os melhores editados no Brasil pela primeira vez em 2020 e os melhores lidos em 2020, mas lançados em outros anos. A maioria apareceu na Resenha de Bolso. Aliás, se você não conhece a Resenha de Bolso, deixo aqui o link pro site e pro Instagram

Os livros da Bíblia não receberam nota por serem livros religiosos. Não me parece fazer sentido atribuir cotação a questões de fé — mas fica aqui a dica para que leiam se quiserem, gostei muito.

La muerte de Jesús, do J.M. Coetzee foi lançado em 2019 e ainda não foi publicado no Brasil, como os dois primeiros livros da trilogia. Digamos que ele se insere num limbo pros critérios da lista. Vou colocar nos lançados fora de 2020 só pela objetividade, mas espiritualmente ele está aqui, em 2020 — um livro que me ajudou muito, e conclusão magnífica pra uma trilogia magnífica.

Ah, alguns livros foram lidos antes de serem publicados, outros ainda estão no prelo — e alguns são ótimos originais que espero ver nas prateleiras assim que o mercado sair dessa crise doida [livros não publicados ainda são livros]. Esse ano eu li quadrinhos e me amarrei. Obviamente, entraram na lista final — tudo é texto, tudo é literatura. Sobre os negritos da lista: livros que mais se destacaram, espécie de longlist para me guiar quando eu fosse eleger os melhores do ano. O livro 92, a pedido da autora, não pode ter seu título revelado, mas é uma belezinha. Espero que seja publicado em 2021. Segue o baile.

Nesse ano de pandemia, eu poderia facilmente ter batido o recorde de 115 livros, mas preferi não. Acho que é bom quando a gente reconhece os limites. No ano da pandemia eu não bati recorde nenhum — e isso é lindo — a desobrigação da força.

Avisos dados, vamos aos livros.

Feliz 2021 ❤

OS MELHORES LIVROS PUBLICADOS NO BRASIL EM 2020

i.
Solução de dois Estados, Michel Laub
Trânsito, Rachel Cusk

Imbatíveis no primeiro lugar desde que foram lidos, os romances de Laub e Cusk oferecem tudo que um bom — e exigente — leitor precisa: boa literatura. Solução de dois Estados representa, numa construção arguta, os descaminhos do Brasil: objetos de um documentário dirigido por uma cineasta alemã, Alexandre e Raquel são dois irmãos que se odeiam e acabam por desnudar-se diante das câmeras. Brutal do início ao fim, Laub não faz concessões ao explorar a arte performativa, as milícias, a intransigência e todo o caldo sociopolítico que resultou na eleição do inominável.

Trânsito, segundo volume da monumental trilogia de Rachel Cusk, traz Faye, a protagonista, de volta a sua Londres após um primeiro romance ambientado na Grécia. Renovando o elenco de interlocutores, Cusk traça um painel da agonia que é existir na contemporaneidade estraçalhada pela tecnologia e pelas imperfeições da vida. Algumas vezes se aproximando do sublime, eis um livro que se aproxima do clichê de “obra em que não acontece nada” somente para retorcê-lo e mostrar que é justamente nas pequenas escolhas que reside o absoluto.

ii.
Corpos secos, Luisa Geisler, Samir Machado de Machado, Natalia Borges Polesso, Marcelo Ferroni
O que ela sussurra, Noemi Jaffe

Outros dois grandes livros. O primeiro, uma aventura distópica num Brasil assolado por uma doença, é divertidíssimo e agoniante na mesma medida. Quando uma doença derivada de agrotóxicos transforma seres humanos em mortos-vivos, os chamados corpos secos do título, quatro personagens — Mateus, Murilo, Regina e Constância — precisam lutar pela própria sobrevivência. Ao longo de 190 páginas que flertam com o gore, este romance escrito por quatro grandes escritorxs nunca perde de vista seu real objeto de interesse: a sociedade e como reagimos no momento em que tudo vira sombra. Mais 2020, impossível.

O novo livro de Noemi Jaffe, por sua vez, é uma pérola que não recebeu a atenção que deveria. Ao refazer a vida de Nadezhda, esposa do poeta Ossip Mandelstam, Noemi recria a URSS stalinista numa crônica iluminada da oposição ao ditador soviético. Nadezhda sussurra os versos do marido para que eles — e ele — não desapareçam da História. Nadezhda coa sua vida com o filtro da beleza. Nadezhda singra por tudo aquilo que resiste. E eis a beleza de um romance único, delicioso, que não se furta a ser impiedoso quando necessário.

iii.
Suíte Tóquio, Giovana Madalosso
Batendo pasto, Maria Lúcia Alvim

Não escrevi sobre Suíte Tóquio porque fui leitor do manuscrito e a ética me impedia — contudo, porém, todavia, como esta é uma lista pessoal e eu realmente li o novo romance de Giovana Madalosso em 2020, preciso deixar o aviso aqui de que é um romance incrível, cheio de vida, que passeia por dois registros absolutamente distintos ao contar a história de uma babá que sequestra a filha de um casal em crise. Brasil, classe média falida, o direito à maternidade: está tudo ali. Que livro lindo.

Não consigo imaginar um livro de poesias lançado em 2020 que supere a força de Batendo pasto, manuscrito inédito de Maria Lúcia Alvim publicado pela Relicário graças aos esforços dos poetas Ricardo Domeneck e Guilherme Gontijo Flores. Lírico, brutal, cortante — nenhum adjetivo dá conta da potência deste livro que permaneceu escondido por quase 40 anos. Leiam Maria Lúcia Alvim. Pra ontem.

iv.
O avesso da pele, Jeferson Tenório
A barata, Ian McEwan

Um ano após Marrom e amarelo, de Paulo Scott, botar o dedo na ferida do racismo nos anos 2010, Jeferson Tenório publicou um livro igualmente necessário: através do filho de um professor covardemente assassinado pela polícia, descobrimos as nuances de uma vida cuja existência foi ameaçada desde sempre. Ora sombrio, ora absolutamente terno, O avesso da pele é daqueles livros obrigatórios para compreender por que em 2020 a escravidão ainda permanece como a característica nacional do Brasil.

O mais novo romance de Ian McEwan é um livro curto e eficiente: invertendo Kafka, uma barata desperta como o primeiro-ministro britânico. É o suficiente para que o leitor se pegue envolvido numa sátira mordaz aos Trumps da vida, mas também, por que não, aos seus imitadores tupiniquins. Se não é o melhor livro do autor de Na praia e Reparação, pelo menos abriu o ano com um sopro de atenção e força — tudo aquilo de que precisamos.

MELHORES LIVROS LIDOS EM 2020, PORÉM LANÇADOS EM OUTROS ANOS

Os livros a seguir não estão em ordem de preferência, mas sim na ordem em que foram lidos.

Os anos, Annie Ernaux
A vista particular, Ricardo Lísias
Esboço, Rachel Cusk
Como funciona a ficção, James Wood
Como se estivéssemos em palimpsesto de putas, Elvira Vigna
Preocupações, Ana Guadalupe
Repatria, Francesca Cricelli
A tortura, Henri Alleg
A cidade inexistente, José Rezende Jr.
Tudo pode ser roubado, Giovana Madalosso
La muerte de Jesús, J. M. Coetzee
As miniaturas, Andréa del Fuego
A morte em veneza, Thomas Mann
Uma janela em Copacabana, Luiz Alfredo Garcia-roza
XX Sonetos, Maria Lúcia Alvim
Deixe o quarto como está, Amilcar Bettega Barbosa
Quem tem medo de Virginia Woolf?, Edward Albee
Knulp, Hermann Hesse
O amante, Marguerite Duras
O clube dos jardineiros de fumaça, Carol Bensimon
Hamlet, William Shakespeare
Libertinagem, Manuel Bandeira
O estrangeiro, Albert Camus
Belo belo, Manuel Bandeira
A hora da estrela, Clarice Lispector
Mar de mineiro, Cacaso
Erguei bem alto a viga, carpinteiros & Seymour — uma introdução, J. D. Salinger
Watchmen, Alan Moore & Dave Gibbons

Todos os livros lidos em 2020

1. Os anos, Annie Ernaux
2. A vista particular, Ricardo Lísias
3. Café da manhã dos campeões, Kurt Vonnegut
4. Diário da queda, Michel Laub
5. A barata, Ian McEwan
6. Esboço, Rachel Cusk
7. Como funciona a ficção, James Wood
8. Como se estivéssemos em palimpsesto de putas, Elvira Vigna
9. A árvore aquela, Vera Pedrosa
10. Preocupações, Ana Guadalupe
11. Belhell, Edyr Augusto
12. Suíte Tóquio, Giovana Madalosso
13. O legado de nossa miséria, Felipe Holloway
14. Repátria, Francesca Cricelli
15. Jukebox, Dimitri BR
16. Maréia, Miriam Alves
17. A tortura, Henri Alleg
18. A cidade inexistente, José Rezende Jr.
19. As histórias de Pat Hobby, F. Scott Fitzgerald
20. O que ela sussurra, Noemi Jaffe
21. Tudo pode ser roubado, Giovana Madalosso
22. Apátridas, Alejandro Chacoff
23. As pequenas virtudes, Natalia Ginzburg
24. La muerte de Jesús, J.M. Coetzee
25. O livro de líbero, Alfredo Nugent Setubal
26. Tudo pronto para o fim do mundo, Bruno Brum
27. As miniaturas, Andréa del Fuego
28. Vaca de nariz sutil, Campos de Carvalho
29. A morte em Veneza, Thomas Mann
30. Espinosa sem saída, Luiz Alfredo Garcia-Roza
31. Uma janela em Copacabana, Luiz Alfredo Garcia-Roza
32. XX Sonetos, Maria Lúcia Alvim
33. Sobre verdade e mentira no sentido extramoral, Friedrich Nietzsche
34. Corpos secos, Luisa Geisler, Samir Machado de Machado, Natalia Borges Polesso, Marcelo Ferroni
35. Deixe o quarto como está, Amilcar Bettega Barbosa
36. Quem tem medo de Virginia Woolf?, Edward Albee
37. O homem que buscava sua sombra, David Lagercrantz
38. Elena Ferrante — uma longa experiência de ausência, Fabiane Secches
39. Costuras para fora, Ana Squilanti
40. Você nunca mais vai ficar sozinha, Tati Bernardi
41. Respiração artificial, Ricardo Piglia
42. Memórias póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis
43. As sobras de ontem, Marcelo Vicintin
44. Gênesis
45. Êxodo
46. Alguém acaba de morrer lá fora, Jô Bilac
47. Batman — Morte em família, Jim Starlin, Jim Aparo
48. Batman — Um lugar solitário para morrer, Marv Wolfman, George Pérez, Jim Aparo, Tom Grummette
49. A morte e a morte de Quincas Berro Dágua, Jorge Amado
50. Knulp, Hermann Hesse
51. Um outro Brooklyn, Jacqueline Woodson
52. O amante, Marguerite Duras
53. Lady Macbeth do distrito de Mtzensk, Nikolai Leskov
54. Copo vazio, Natalia Timerman
55. Novo livro de poesias da Luiza Mussnich
56. Canções de atormentar, Angélica Freitas
57. Trânsito, Rachel Cusk
58. O clube dos jardineiros de fumaça, Carol Bensimon
59. Safári, Cláudia Sehbe
60. A piada mortal, Alan Moore e Brian Bolland
61. Os pecados dos pais, Lawrence Block
62. Perseguido, Luiz Alfredo Garcia-Roza
63. Amorhumorumor, Alice Ruiz S & Rodolfo Witzig Guttilla
64. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica, Walter Benjamin
65. O inquietante, Sigmund Freud
66. O avesso da pele, Jeferson Tenório
67. Pedro Páramo, Juan Rulfo
68. Hamlet, William Shakespeare
69. Solução de dois estados, Michel Laub
70. Libertinagem, Manuel Bandeira
71. O estrangeiro, Albert Camus
72. *****, Pedro Guerra
73. Novo romance da Paula Gicovate
74. Morra, amor, Ariana Harwicz
75. Batendo pasto, Maria Lúcia Alvim
76. A débil mental, Ariana Harwicz
77. A palavra cerzida, Cacaso
78. A cinza das horas, Manuel Bandeira
79. Grupo escolar, Cacaso
80. Aforismos de Zürau, Franz Kafka
81. O terceiro homem, Graham Greene
82. Pedra do sono, João Cabral de Melo Neto
83. Escoliose — paralelismo miúdo, Ana Frango Elétrico
84. Novo livro de crônicas do Marcelo Moutinho
85. Estrela da manhã, Manuel Bandeira
86. Pedaço de mim, Edith Elek
87. Narciso em férias, Caetano Veloso
88. Belo belo, Manuel Bandeira
89. Bruno Schulz conduz um cavalo, Leda Cartum e Marcos Cartum
90. O impostor, Edgard Telles Ribeiro
91. Beijo na boca, Cacaso
92. [livro que ainda não saiu mas eu gostei DEMAIS — de poesias]
93. Carnaval, Manuel Bandeira
94. As durações da casa, Julia de Souza
95. Segunda classe, Cacaso e Luis Olavo Fontes
96. Segredos, Domenico Starnone
97. Terra nos cabelos, Tônio Caetano
98. Armadilha mortal, Roberto Arlt
99. Na corda bamba, Cacaso
100. Parece que piorou, Bruna Maia
101. Mapas para desaparecer, Nara Vidal
102. A hora da estrela, Clarice Lispector
103. Ao pó, Morgana Kretzmann
104. Nas frestas das fendas, Maria Clara Parente
105. Mar de mineiro, Cacaso
106. Zuza Zapata, Na cidade um ruído que arde
107. Erguei bem alto a viga, carpinteiros & Seymour — uma introdução, J. D. Salinger
108. Watchmen, Alan Moore & Dave Gibbons
109. Carta a um religioso, Simone Weil
110. O invasor, Marçal Aquino
111. Emily L., Marguerite Duras
112. Otto Lara Resende ou Bonitinha, mas ordinária, Nelson Rodrigues

É isso. Foi isso. Se você leu tudo, muito obrigado.
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Feliz 2021!

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